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Bibliomaníaca: glamour e codependência
Não selecionei os livros do mês passado com esse objetivo em mente, mas assim que sentei para escrever a coluna percebi que todos eles tinham um tema em comum: glamour e codependência, duas coisas que estão mais próximas do que eu pensava.
Antes de virar sinônimo de elegância, glamour era uma palavra cujo significado era encanto, feitiço. As coisas que me enfeitiçaram mudaram ao longo dos anos: de viver a vida como Christina Aguilera em um clipe da era Dirrty a ter independência financeira e estabilidade emocional antes dos trinta (chato, eu sei). Mas uma coisa continuou a mesma – a necessidade de algo externo a mim que ofereça a promessa de uma realização ainda desconhecida.
É essa a semelhança que encontro entre glamour e codependência: a carência que os alimenta. Fumar cigarros era e ainda é um sinônimo de glamour. Mas quando pensamos com mais clareza conseguimos ver que, por trás do fumante charmoso, existe alguém ansioso e desesperado por algo a fazer que justifique a presença dele em ambientes sociais. Glamour é um acessório que substitui aquilo que acreditamos nos faltar. O que leva à pergunta: existe alguma forma de fascínio que não esconda um buraco de ansiedade? Não sei, mas continuo à procura!
Fifth Avenue conta a história da produção do filme e mostra a mudança que ele provocou no imaginário cultural sobre mulheres solteiras – de solteironas problemáticas a aventureiras divertidas. Isso ocorreu graças a uma mudança pesada no enredo do livro original, escrito por Truman Capote, uma escolha acertada de elenco, e habilidade para desenrolar a censura da época (o código Hays, vigente de 1930 até 1968).
O livro melancólico e controverso de Capote foi transformado em uma história de amor fofinha. A Holly Golightly do livro original de Truman Capote era uma prostituta e usuária de cocaína, e o narrador, seu amigo gay. Na versão de Hollywood, porém, a ocupação de Golightly é tão suavizada que um espectador desavisado pode interpretar que se trata só de uma jovem interesseira que sai com vários caras por diversão. E o narrador dá lugar a um mocinho apaixonado e bem heterossexual, Paul Varjak (George Peppard).
A escolha de Audrey Hepburn para o papel principal foi crucial para dar um aspecto inocente à personagem, já que a atriz tinha um histórico de interpretar mocinhas ingênuas e era mais famosa pela elegância do que pelo apelo sexual. O roteiro também pesou a mão no quão machão Varjak deveria ser. O objetivo era eliminar qualquer dúvida que o público pudesse ter em relação à sexualidade dele, já que o personagem original do livro era gay. E assim nasceu um clássico que até hoje estampa almofadas nos quartos de meninas adolescentes.
Esse livro virou post aqui no Deixa de Banca, e pretendo escrever mais ainda sobre Helen Gurley Brown no futuro. Publicitária, escritora e posteriormente editora-chefe da revista Cosmopolitan, ela me fascinou por ser uma figura tão contraditória. O modelo de “mulher profissional” promovido por Gurley Brown pretendia ser autossuficiente, mas uma análise mais crítica revela o quanto ele era motivado pela aprovação masculina.
Gurley Brown vendia uma imagem de uma pessoa autoconfiante e sem papas na língua, mas as cirurgias plásticas, insistência em estar sempre maquiada e obsessão por estar magra parecem revelar um problema muito grave de auto-imagem. Para chegar até o topo, ela incorporou o ideal misógino do que uma mulher deveria ser, e fez isso com senso de humor e inteligência admiráveis, mas qual deve ter sido o impacto emocional de guardar tantas contradições em si mesma?
Essas são minhas reflexões, já que Sex and the single girl passa longe de ser uma autobiografia confessional. É um auto-ajuda ácido e frívolo que ajudou a consolidar a figura da mulher solteira, sensual e independente que serviu de modelo para tantas gerações – a minha inclusive.
Seguindo o tema de insegurança, feminilidade e glamour, o livro de Emma Cline narra a história de um culto na Califórnia fortemente baseado na família Manson. A novidade é a história ser narrada por uma integrante do grupo que a) não participou dos assassinatos e b) não entrou no culto por causa do líder, Russell, e sim por uma paixão platônica por uma das integrantes, Suzanne.
Em vez de se focar na figura de Russell, Cline está mais interessada em explorar a dinâmica entre as garotas que fazem parte do culto e os motivos que as levaram até lá. As garotas traz uma visão original sobre como a feminilidade torna mulheres vulneráveis para abusadores como líderes de culto – e também dificulta que elas consigam se apoiar umas nas outras e encontrar uma saída.
Ótimo livro para anedotas do passado, péssimo para conclusões feministas. Glamour: history, women, feminism nos mostra como “glamour” virou uma palavra-chave entre os anos 1930 e 1950 nos EUA e na Inglaterra, e o papel que ela teve na venda de produtos de moda e beleza. Se nos anos 20 era uma palavra que carrega orientalismo e aventuras em terras distantes, nos anos 30 ela passou a representar feminilidade e charme.“Glamour era frequentemente ligado a um sonho de transformação, um desejo por algo fora do ordinário, uma forma de aspiração, uma ficção de se tornar mulher”.
Aprendi que nos anos 20 pijamas eram glamourosos e camisolas, bregas. No final dos anos 30, uma agência de publicidade conseguiu reverter a queda na venda de diamantes associando-os à ideia de “romance”, ao fazer estrelas de cinema usarem joias em público. Casacos de pele foram o auge do luxo até os anos 40 chegarem e peles passarem a ser associadas com “mulheres da vida”.
Dyhouse traz detalhes vívidos sobre como mulheres (celebridades e anônimas) se torturavam para se encaixar no modelo de glamour, de remédios laxativos para emagrecer a água oxigenada e ácido bórico nas axilas para impedir o suor (“uma fonte de profunda vergonha”). Mas as conclusões são decepcionantes: Dyhouse acredita que o glamour pode ser uma ferramenta para alcançar autonomia e auto-estima, e acaba professando a mesma ideia de anúncio dos anos 20 para creme de pele: “Beleza é poder”.
Sempre tive pirraça com o nome desse livro. Me parecia uma forma de culpar mulheres pela violência que sofreram em relacionamentos, e o termo “amar demais” me soava incorreto. Mas assim que comecei a ler esse livro, eu perdi toda a resistência. Mulheres que amam demais não é um manifesto feminista, e nem precisa ser. É um livro de auto-ajuda que procura fazer mulheres codependentes enxergarem os próprios padrões de relacionamento e a se desvincularem deles. É uma forma de reconhecer que você não tem “dedo podre”, é “trouxa” ou tem “azar no amor”, e sim escolhe se relacionar com pessoas indisponíveis.
Não se pode negar, é claro, que homens são um bilhão de vezes mais predispostos a cometer abusos e violências devido à masculinidade. Você não causa situações de negligência ou violência, e nem tem culpa por elas. É mais como se a sua doença e a doença do cara se encaixassem, formando um vínculo difícil de se soltar. Frequentemente me sinto perdida entre dois discursos. Um culpabiliza vítimas e tira a responsabilidade dos agressores de foco. Outro reconhece os fatores sociais, mas oferece poucas ferramentas para lidar com questões interpessoais do cotidiano. O meio-termo entre os dois, esse livro foi uma salvação.
Afinal, não espero que o feminismo me ofereça conselhos para como me relacionar melhor com homens, mas querendo ou não, essa acaba sendo uma questão importante na minha vida. E às também precisamos de respostas que sejam individuais, que o debate político pode informar mas não resolver completamente. Eu sou uma vítima em várias situações, e preciso ser reconhecida como tal, mas ser vítima não me impede de me responsabilizar pelas minhas próprias ações e buscar me comportar de uma forma que seja mais saudável para mim. Não é a revolução feminista a todo vapor, mas é uma redução de danos que me dá paz.
Trata-se de um livro de autoficção que pode ser resumido nas palavras da própria Chris Kraus, quando imagina o que Dick diria sobre o projeto: “Trepe com ela uma vez, ela vai escrever um livro sobre isso”. I love Dick, que virou série pela Amazon sob a direção de Jill Soloway, é notório por retratar a obsessão da realizadora Chris Kraus com o teórico de mídia Dick Hebdige, um colega do seu então marido, o filósofo Sylvère Kraus.
Depois de um jantar na casa de Dick, Chris se apaixona de vez e, para lidar com a crise, o casal começa a escrever cartas para ele. Chris tem a ideia de transformar o material em um projeto, mas Dick não está interessado em participar, o que só parece incentivar mais ainda a obsessão do casal.
Kraus oferece um retrato cru da própria codependência, e mostra como Dick não é um ponto fora da curva na sua trajetória com homens. O próprio relacionamento com Sylvère se baseia numa dinâmica codependente. O casamento estava em ponto morto até a paixão repentina por Chris: agora que ela estava emocionalmente indisponível para Sylvère, eles finalmente conseguiram fazer sexo de novo.
A tentativa de Sylvère de incluir Dick, formando um estranho relacionamento à três, parece uma forma de manter Chris no casamento: se não pode vencer o cowboy críptico por quem sua esposa se apaixonou, junte-se a ele.
A estrutura do livro também emula muito bem a situação que qualquer pessoa que tenha vivido uma paixão platônica consegue se identificar. Chris e Sylvère esgotam minúcias de interações triviais com Dick, fazem apelos, tentam vencer com o charme. Os momentos em que Dick de fato aparece, porém, são breves. I love Dick nos carrega em uma eterna tensão à espera de que ele apareça de novo e “algo” aconteça, mas, como Kraus, somos frustrados: “nada” acontece.
O que é mais interessante em I love Dick, porém, é como Kraus consegue, a partir do sofrimento dela, traçar uma reflexão necessária sobre o lugar da mulher na arte: como a produção feminina é sempre vista como meramente pessoal ou confessional, e a artista taxada de louca ou carente de atenção. A rejeição que Kraus sente na sua vida amorosa é análoga a que ela recebe no mundo da arte e da academia.
“Por que a vulnerabilidade feminina só é aceitável quando é neurotizada e pessoal, quando ela alimenta a si mesma? Por que as pessoas não entendem quando entregamos vulnerabilidade como uma filosofia, à distância? (...) Por que todo mundo pensa que mulheres estão degradando a si mesmas quando nós expomos as condições da nossa degradação?”.Dick não é só mais um cara que não deu bola para a gente, é o símbolo da aprovação masculina que buscamos e que precisamos para conseguir alguma validação na sociedade. Por esse motivo o título de Kraus para seu romance é tão brilhante, Eu amo Dick, condensando homem, babaca e pau na mesma palavra.
Nesta autobiografia, a escritora feminista Jessica Valenti analisa não só como os homens que conheceu durante a vida a trataram como um objeto sexual, mas também como ela mesma incorporou a ideia de que deveria ser tratada desse jeito.
Uma garota de classe média baixa e origem judaica em meio a um oceano de meninas loiras dos olhos azuis em uma escola de elite, Valenti aprendeu desde cedo que o único modo que ela tinha de ganhar atenção dos colegas era por meio dos seus peitos e piadas desbocadas sobre sexo. O livro revela as violências que Valenti sofreu desde a infância até a vida adulta: homens assediadores no metrô, um ex-namorado abusivo, um estupro. É claro no texto como ser tratada dessa forma teve um impacto grande na auto-estima de Valenti.
Ela odeia a própria imagem (“Odiar o seu rosto exige uma grande quantidade de cuidado e atenção, (...) você começa a amar o ódio que tem por si mesma”). Por causa da perseguição de um ex-abusivo, para de ir para as aulas e acaba correndo o risco de ser expulsa da faculdade. Enquanto o site feminista que cria começa a deslanchar, Valenti se afunda no vício em pó e em um relacionamento com outro dependente químico, que para completar o pacote é infiel e mentiroso.
É um livro fácil de ler mas difícil de digerir, e ele termina em angústia. Embora tenha um casamento relativamente bem resolvido e uma carreira de sucesso, agora Valenti se preocupa com o legado que o mundo tem a oferecer à filha dela.
“Ter uma filha significa passar isso para ela, essa violência e essas violações sem fim. Porque enquanto minha filha vive em um mundo que sabe que o que acontece com as mulheres é errado, ele também aceitou esses erros como algo inevitável."✨
Fique comigo e leia Bibliomaníaca: o que li em maio e The Love Witch: investigando a mulher louca por macho.
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